quarta-feira, 23 de dezembro de 2009

A contra-revolução jurídica

 Muitos analistas de política têm apontado um recrudescimento do papel da política no cenário das disputas sociais, após um longo processo de esvaziamento da mesma. Este esvaziamento teria surgido no horizonte social em função de uma espécie de refluxo, por conta, em parte, de derrotas do movimento social nas décadas de 1970 e 1980. Este período corresponde, grosso modo, ao triunfo da vaga neo-liberal. Pretendia-se, num viés explicativo, demonstrar o esboroamento das lutas sociais, ou de qualquer necessidade de se orientar as demandas sociais através de conflito. O que restaria aos insatisfeitos era se adequar aos novos tempos, ou em outras palavras, ao mercado. E mais, essa adequação se daria de forma atomizada, ou seja, cada um por si e salve-se quem puder. Era o fim da história...
 Pois então, o tal recrudescimento da política entra no cenário latino-americano (ou Abya Yala, ver artigo de Carlos Walter aqui no blog), no final da década de 1990 e início do novo século, com a chegada ao governo, de forma democrática, de grupos até então estranhos ao poder nesse continente. Foi o caso das eleições de Hugo Chávez, Lula, Evo Morales e outros. Esses novos personagens vão de alguma forma politizar a política e produzir uma nova agenda, ferindo, muitas vezes, os interesses dos grupos tradicionalmente hegemônicos do continente. Surge um novo empoderamento.
 Mas é óbvio, por outro lado, que os tradicionais donos do poder não iam simplesmente se retirar do jogo político ou aceitar pacificamente as novas agendas, etc. etc. etc. E é sobre isso que o professor Boaventura de Souza Santos nos fala em um belo artigo: "a contra-revolução jurídica". Nesse artigo elenos fala de como o conservadorismo ferido no campo político e perdendo cada vez mais seu poder de convencimento, se aloca no campo judiciário, para dali perpetrar seus gestos políticos. Ele fala de um acorde tácito, que sinceramente, eu desacredito. Pelo menos em alguns casos.
 Siga o link abaixo e leia na íntegra o texto do professor Boaventura:

terça-feira, 22 de dezembro de 2009

Um cordel para o Rio de Janeiro

Este cordel é o resultado de um trabalho que fizemos com a turma 1701 da Escola Emiliano Galdino no segundo semestre de 2009. A ideia do trabalho era o de desenvolver no aluno uma leitura mais fluente. Trabalhos diversos elementos, tais quais a compreensão da estrutura das sílabas poéticas (no caso 7), interpretação de texto e compreensão rítmica dos versos (acentos tônicos). Fizemos leituras em sala de aula de diversos títulos: "As proezas de João Grilo"; "Lampião, o capitão do cangaço"; "Peleja de Riachão com o Diabo" e o "Romance do pavão misterioso". Este último foi de longe, o mais apreciado de todos. No final os alunos compuseram este cordel que você poderão ler abaixo.




UM CORDEL PARA O RIO DE JANEIRO





Vou contar nesse cordel
Uma história interessante
Sobre o Rio de Janeiro
Uma cidade elegante
Chamada maravilhosa
Que tem muitos habitantes


Já há muito tempo atrás
Nasceu uma bela cidade
Humilde e muito pequena
Que tinha simplicidade
Era um belo lugar
Sem tristeza nem maldade


Para o Rio vieram os franceses
Prá uma colônia fundar
Acabaram sendo expulsos
Não puderam continuar
Foram buscar novas terras
Lugares pra explorar
  
Aqui no Rio de Janeiro
Lá no Campo de Santana
No século dezenove
Uma data bem bacana
Aconteceu a República
História de muita fama


No morro do Corcovado
Tem o Cristo redentor
Um monumento importante
Que tem um grande valor
Uma das sete maravilhas
E tem todo nosso amor


Os olhos do redentor
Parecem observar
Todo o Rio de Janeiro
Estrela desse lugar
Abençoando a todos
Com a santidade do olhar


Das praias do nosso rio


Tem muito pra se falar
Muitas mulheres bonitas
Que só aqui pode achar
Tem marés e horizontes
Belezas de se encantar


Lá na praia de Ipanema
Gosto de me bronzear
A garota mais bela
Vejo por ali passar
É a mulher mais bonita
Que eu já vi desfilar


Pão de açúcar lá no Rio
É um morro interessante
Pois lá tem muito turista
Que é gente importante
E tem uma paisagem linda
Sem igual e verdejante


O bonde do Pão de Açúcar
Vive prá lá e prá cá
Fica em cima de um fio
Eu vou prá lá passear
Mas fico com muito medo
De o cabo arrebentar


Em dois mil e dezesseis
No Rio acontecerá
Será a primeira vez
Que o Rio vai sediar
Virá gente do estrangeiro
Para aqui se encontrar


Nosso Rio também é
A cidade do esporte
Tem futebol, voleibol
Atletas de muito porte
Por isso nas olimpíadas
É candidata bem forte


Quando está muito calor
Eu saio do meu lençol
E vou curtir uma praia
Pegar uma cor com sol
Aí dou uma pescadinha
E jogo meu futebol


Futebol aqui no Rio
É um esporte bem legal
Todo mundo gosta dele
Porque é sensacional
E quando um time faz um gol
É alegria sem igual


Domingo assisto ao jogo
O jogo do meu mengão
Ele é o melhor time
E vai ser o campeão
Já está lá no G4
É melhor que a seleção


Nesta cidade do Rio
Tem uma festa bem legal
Que acontece em fevereiro
O nome dela é carnaval
Muita gente se diverte
Nesta festa surreal


Todo dia tem escola
Pois é lá que eu aprendo
Já aprendi a escrever
E também já estou lendo
De manhã faço um lanchinho
E de tarde eu merendo


A escola aqui do Rio
É muito especial
A gente aprende a escrever
E isso é muito legal
Cresce a cultura do aluno
De forma sensacional


Nosso funk carioca
É cultura e lazer
É do Rio de Janeiro
O ritmo do prazer
Que abala muita gente
Isso você pode crer


Um problema da cidade
É ter muito traficante
E tem muita violência
Também muito meliante
Existem várias favelas
Também muitos assaltantes


Uma parte da polícia
Pode tudo por dinheiro
Isso também acontece
Nesse Rio de Janeiro
As vezes o bicho pega
E é só tiro o dia inteiro


Mas toda cidade grande
Tem o ritmo assim
Acontecem coisas boas
Acontecem coisas ruins
Mas morar nessa cidade
É mesmo um prazer pra mim


No cordel dessa cidade
Contei coisas de esplendor
Praias, esportes, lugares
Até Cristo redentor
Ainda falta muita coisa
Mas por aqui já acabou


Já encerro por aqui
A história que eu contei
Não sei se todos gostaram
Mas eu sei que eu gostei
É do Rio de Janeiro
Que jamais esquecerei






Cordel do Rio de Janeiro







domingo, 20 de dezembro de 2009

O vendedor de passados


     "O vendedor de passados" é um romance sobre a memória, quer dizer, sobre sonhos, ou melhor, sobre a memória / sonho. E como ele mesmo diz: "um sonho não se tem, um sonho se constrói". Apesar da atmosfera onírico-mágico-surrealista, a trama é muito bem construída. Ela trata de um sujeito, o Félix Ventura (este sobrenome é bastante significativo) que vive de criar passados e inventar memórias. As pessoas que o procuram pertencem a posições sociais que lhes garantem o futuro, mas que não provê um passado, ou uma memória compatível com seu status.
     Em uma passagem curiosa o personagem Ventura faz um paralelo entre o seu ofício e a literatura. Ele acredita que o que faz é, de certa forma, literatura, pois ele também inventa personagens, com suas tramas e tudo mais. Só que ao invés deles ficarem presos às páginas de um livros, saltam para a vida.
     É curioso também que toda essa narrativa, ou quase toda, visto que há mudança de foco narrativo, é feita por uma osga (é como em angola se chama essas lagartixas de parede). É verdade que é uma osga absolutamente humanizada, cujos sonhos remetem a uma vida humana anterior. Há até momentos em que os sonhos da osga e do personagem Ventura se fundem de forma fantástica.
     É um excelente livro, com nuances poéticas da melhor qualidade e com aquelas frases que nos faz de repente parar de ler o livro e ficar a pensar...


O vendedor de passados
José Eduardo Agualusa
Editora Gryphus