sábado, 7 de novembro de 2009

As últimas (quem dera) do Caetano

já virou lugar comum comentar as besteiras ou "polêmicas", como querem uns, do Caetano Veloso. Confesso que isso me cansa um pouco, e ao ler sobre sua mais recente entrevista ao jornal Estado de São Paulo não fui tomado por nenhuma surpresa. Mas resolvi fazer esse comentário porque há dias atrás postei um sobre Gilberto Gil no qual Gil se liga a um conjunto de idéias que parece ser oposto ao que seu colega conterrâneo professa.
Chamar Lula de analfabeto e cafona é fazer ecoar uma série de preconceitos mesquinhos e tacanhos tão ao gosto da nossa bem escolarizada elite reacionária. Aquela elite do tipo "Cansei", que acha lindo fazer cartazes fazendo menção ao dedo amputado de Lula.
Para quem gosta e consegue rir dessas coisas, deve ser interessante ler a entrevista. Há nela, por exemplo, verdadeiras pérolas, como a que afirma que José Serra, uma vez que tivese ganho a eleição faria uma gestão econômica de esquerda. Enfim...abaixo reproduzo um excelente comentário de Mauro Carrara sobre a entrevista de Caetano, e um link para a entrevista (para quem tiver estômago).
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Caetano Veloso e a perfeita imbecilidade ególatra


por
Mauro Carrara

Disse o baiano ao jornalão dos Mesquitas, declarando seu voto em Marina Silva:

- Ela é meio preta, é cabocla, é inteligente como o Obama, não é analfabeta como o Lula, que não sabe falar, é cafona falando, grosseiro. Ela fala bem.

A declaração é reveladora. Serve bem a desmascarar esse Caetano ególatra, subproduto pós-moderno de si mesmo, tolo que substituiu o poeta sem lenço e sem documento.

O atual Caetano, aliás, converteu-se numa espécie de Gabeira sem carreira parlamentar.

Folga em construir frases de efeito (?) que ecoem o pensamento da malta conservadora.

Aliás, ególatras, tanto um quanto outro, pronunciam aquilo que os eleva a ícones publicitários da mídia reacionária e monopolista.

Para Cagabeira, bons alunos de FHC, princípios e história estão em segundo plano. Vale a exaltação do "eu", muitas vezes doentia, muitas vezes ridícula, quase sempre deprimente.

Cabe lembrar que, no agora decadente, ambos não se envergonham de adular o tucano-demismo. Julgam-se, assim, diferentes, autônomos, batutas...

No caso do compositor baiano, não há acanhamento na rotina de visitas à casa grande. Pede-se a "bença" ao coronel, como se isso fosse "bonitinho", supimpa.

Logicamente, ao sair, entregam-lhe na varanda uma cesta de pães amanhecidos, uns maracujás murchos e até uns tostões, prova da generosidade do senhor de engenho.

Caetano se julga o gênio da raça, o supra-sumo da cultura mestiça brasileira, o sol da Tropicália, o sabe-tudo que, de tão sabedor, pode desprezar os incultos da pátria. Blasé por desejo divino e necessidade.

O poeta se julga mais poeta porque inventa coisas enigmáticas que o povo não compreende. Acredita, desde sempre, que se distinguiu dos mortais da arte ao reproduzir os voos concretistas dos irmãos Campos e de Décio Pignatari.

Qual seria, então, o conceito caetanista de analfabetismo? E o que seria "saber falar"? Para quem cagou montes para a regra, o vetusto Caetano agora se arroga protetor da norma culta.

Metido com os descolados gurus da Semiótica, tão afeitos à subversão das formalidades da língua, Caetano vai terminando a vida como um ortodoxo, rabugento e tolo capataz copista.

Talvez o que incomode Caetano seja justamente a inteligência de Lula, sem verniz, sem laços, fitas e rimas forçadas. O pernambucano comunica-se, transmite a mensagem e, mais que isso, faz de sua locução uma poderosa arma de transformação. Lula, para completar, é autêntico e "faz acontecer".

Ora, isso causa muita inveja nessa turma dos pedidores de "bença", tantos deles enfiados na boa Bahia, uns rebolando em cima de trios elétricos pagos pela Philips, outros servindo de escribas para a família Marinho.

Ironicamente, o Caetano envelhecido, cruzado da gramática, também levaria puxões de orelha dos Pasquales da vida. Pontua mal, embanana-se em conjugações e, não raro, confunde-se nas regências.

Por fim, talvez "cafona" seja a palavra mais "cafona" da língua. Perceba-se: somente cafonas e afetados a utilizam.

E a que será que se destina, a cajuína?

No caso de Caetano, fazer papel de imbecil ególatra. Esta, pois, virou a sua sina.
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link para a entrevista
http://www.estadao.com.br/noticias/arteelazer,as-ultimas-de-caetano-veloso-em-entrevista-exclusiva,461281,0.htm

terça-feira, 3 de novembro de 2009

Outros viram

No novo disco de Gilberto Gil, Banda Larga Cordel, há uma canção na qual ele tematiza a questão do Brasil ter sido visto por várias personalidades ilustres (Tagore, Maiakovski, Walt Whitman) como um país interessante de onde iria ou poderia sair uma novidade ímpar no mundo. Em outros tempos isso soaria como ufanismo nacionalista digno das patriotadas perpetradas pela ditadura militar, ou mesmo antes, no século XIX, quando Um Afonso Celso escreve: "porque me ufano de meu país". Mas não é nada disso. A reflexão de Gil é atualíssima e tenta justamente responder a uma cambada tacanha que só consegue ver o Brasil como o Cronicamente inviável.

Essa mesma percepção de certa forma está disseminada por certo meio popular, que vez por outra aparece dizendo que nossa infelicidade é um mal de raiz, e que o problema que a miscigenação nos faz uma "raça" indecisa e vagabunda. Enfim... o comentário que Gil faz sobre sua própria canção é emocionado e visceral. Nele, Gil tenta falar diretamente aos detratores do Brasil, aos que pensam (pensam??) a inviabilidade do país como um fato e destino. "Outros viram" e Gil também viu..